Dia Nacional do Deficiente Visual: a história de Josué Quirino, o primeiro professor cego do ensino público regular de Alagoas
Buscando a inclusão de todos, a Secretaria de Estado da Educação promove ações de inclusão a profissionais, jovens e estudantes com deficiência
Com uma história de superação exemplar, Josué Quirino foi aprovado em concurso público da Educação e agora compõe o quadro de professores efetivos na unidade de ensino na Escola Estadual Profª Julieta Ramos Pereira
Thiago Ataíde
Joyce Andrea e Ana Paula Lins
A educação de Alagoas é
marcada pela acessibilidade a estudantes e profissionais com deficiência
visual. Além dos três centros especializados para atender especificamente essa
parcela da população e do empenho dos professores da educação especial, a
Secretaria de Estado da Educação (Seduc) celebra o Dia Nacional da Pessoa com
Deficiência Visual, comemorado nesta terça-feira (13), contando a história do
primeiro professor deficiente visual da rede de ensino estadual.
Josué Quirino foi aprovado
no concurso público da Educação e agora compõe o quadro de professores efetivos
na unidade de ensino na Escola Estadual Profª Julieta Ramos Pereira, sendo o
primeiro professor a atuar em uma escola de ensino regular em Alagoas. Até
então, os professores com deficiência visual aprovados em concurso da Seduc
eram diretamente encaminhados para o Centro Cyro Accioly, instituição que é
referência no atendimento a pessoas com limitações na visão.
O professor Josué tem a
chance de compartilhar a sua experiência com pessoas que enxergam, fazendo com
que as mesmas entendam a realidade de um deficiente visual e colaborem para
transformar o ambiente escolar em um espaço mais inclusivo. Com uma trajetória
de superação de barreiras, ele diz que não quer ser considerado herói, mas
inspira a todos que têm a oportunidade de conhecê-lo e aprender um pouco com a
sua força de vontade.
“Estou aqui aberto a aprender com vocês, e não só contribuir com a formação dos alunos, mas para o desenvolvimento da inclusão aqui na rede estadual. Uma vez que essa é uma ótima oportunidade, por não ser uma realidade ainda em nossa sociedade, uma pessoa com deficiência estar em uma sala de aula como professor. É uma forma até para o aluno vivenciar essa realidade, viver com o diferente e trabalhar essa aceitação. À medida que também posso passar a mensagem para eles de que todos podem superar suas barreiras”, afirmou Josué.
Superação
Desde sua infância, Josué
sofre de deficiência visual progressiva, o condicionando a passar boa parte da
vida com baixa visão, dificuldade essa que não o impediu de se desenvolver
enquanto cidadão e buscar seu lugar na sociedade. Aos 41 anos, Josué já carrega
consigo a sabedoria adquirida após três formações: Teologia, Direito e
História. E mais: o professor já era servidor público do estado de Alagoas e
desempenhou a função de vigilante em duas unidades de ensino, na própria Escola
Julieta Ramos e, posteriormente, no Centro de Educação Especial Cyro Accioly,
em Maceió.
Com o agravamento da sua patologia,
Josué passou a fazer parte do Centro Cyro Accioly, onde também começou a
estudar Braile (sistema de escrita tátil), computação e tecnologias da
inclusão. Hoje, clinicamente diagnosticado com cegueira total, Josué leciona a
disciplina de História para os estudantes do Ensino Médio de forma
independente, com o auxílio dessas tecnologias integradas ao seu computador, a
exemplo do programa Dosvox, que o ajudará a ler e escrever para preparar suas
aulas, além de contar com ferramentas como o retroprojetor, para a exposição de
conteúdo. Porém, mais do que o ensino curricular básico, o professor está
levando consigo a missão de transformar a perspectiva de toda a comunidade
escolar sobre a capacidade das pessoas com deficiência.
Referência
A comunidade da Escola
Julieta Ramos, por sua vez, acolheu de forma calorosa o ex-vigilante, que agora
retorna como professor. Edvaldo Leite, gestor da unidade de ensino, afirma que
receber um professor com deficiência visual será um desafio prazeroso para a escola,
que já tem um histórico de trabalho de inclusão entre seus alunos e
profissionais.
“Para nós aqui da escola é
um orgulho. Nós estamos sendo premiados em receber um professor com deficiência
visual que passou por mérito próprio num concurso público e está vindo agregar
com seu conhecimento. Com certeza o Josué servirá de espelho, para que nossos
alunos possam perceber, na prática, como conduzir suas mais diversas
especialidades. E para aqueles que deixam de frequentar a escola, por conta das
suas deficiências, vejam nele uma inspiração de vida,” pontuou o gestor.
A unidade passou por
adaptações para a integração do professor, onde foram aplicados pisos táteis
nos corredores e inseridas sinalizações em Braille nas salas de aula para
facilitar a sua locomoção. Também é de responsabilidade da unidade, solicitar
ao Ministério da Educação (MEC) o envio do material pedagógico no sistema
Braille, que auxilia no planejamento de aulas e condução do currículo da
disciplina.
Em sua apresentação na escola, o professor Josué destacou a importância da inclusão social para que mais pessoas com deficiência possam desempenhar papéis de maior expressão e participar ativamente da sociedade. “Essa abertura que o estado está dando para que as pessoas com deficiência participem de concursos dá a possibilidade de a sociedade compreender que nós deficientes existimos, que somos capazes, e estamos na sociedade fazendo parte dela. O diferente pode repelir ou aproximar, tudo depende de como essa relação é criada”, diz Josué.
“Então, espero
contar com a contribuição dos colegas para executar o meu trabalho. E tirando
pelo acolhimento que recebi aqui [na escola], as minhas expectativas são as
melhores”, completa o professor.
Inclusão
A posse de Josué como
professor efetivo representou mais um capítulo de uma longa jornada que a Seduc
percorre na promoção da inclusão de pessoas com deficiência na rede estadual de
ensino. Seja pela referência do trabalho exercido pelos seus três centros
especializados (Cyro Aciolly, Wandette de Castro e CAS) ou pelo empenho dos
profissionais da educação especial que atuam nas escolas de ensino regular, a
meta da secretaria sempre foi ampliar a participação e integração da pessoa com
deficiência no meio escolar.
Outro passo importante foi
dado com o concurso realizado em 2021. Além da cota para candidatos com
deficiência - regulamentada por meio da Lei 8.213, Decreto 9.508/2018 - o
certame, pela primeira vez, disponibilizou vagas para professores da educação
especial. Ao todo, foram 342 vagas para profissionais que estarão lotados em
todas as escolas da rede estadual para atuarem junto aos estudantes com
deficiência.
“Esse concurso promoveu um feito histórico. A partir do momento em que temos um professor com deficiência visual sendo empossado e ministrando aulas, isso vai motivar mais pessoas com deficiência a participarem de concursos públicos como também vai atrair mais estudantes nesta mesma situação para a rede estadual de ensino. Além disso, nos permite repensar nossa prática pedagógica enquanto escola”, avalia a supervisora de Educação Especial da Seduc, Jedalva Santos.
Já para a secretária de
Estado da Educação, professora Roseane Vasconcelos, outro diferencial na
inclusão foi a oferta de vagas para a educação especial no certame. “Avançamos
muito na inclusão das pessoas com deficiência em toda a rede estadual de
Alagoas. Além da contratação de profissionais excelentes como o professor
Josué, também reservamos vagas para a educação especial. Esses professores e
professoras farão um importante trabalho de inclusão e acessibilidade
pedagógica e arquitetônica nos espaços escolares”, destacou Roseane.
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